Uma nova enzima pode transformar óleo de milho em combustível para aviões

Cientistas brasileiros descobriram uma enzima capaz de transformar um subproduto do etanol de milho em biocombustível para aviação. A inovação pode tornar o setor aéreo mais sustentável, reduzindo a dependência de combustíveis fósseis e as emissões de carbono.

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A busca por biocombustíveis renováveis pode transformar o futuro da aviação.

A busca por alternativas sustentáveis aos combustíveis fósseis deu um grande o à frente com uma descoberta de cientistas brasileiros. Pesquisadores do Laboratório Nacional de Biorrenováveis (LNBR), do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), em Campinas, São Paulo, em colaboração com a Sinochem Petróleo Brasil, publicaram um estudo na revista Nature Communications revelando uma tecnologia inovadora.

Eles identificaram uma enzima capaz de transformar o óleo de destilação do etanol de milho (DCO, na sigla em inglês) em hidrocarbonetos que podem ser usados como biocombustíveis, incluindo o querosene sustentável de aviação.

A pesquisa pode representar um marco na produção de combustíveis renováveis, já que o Brasil e outros países produtores de etanol de milho geram toneladas desse subproduto todos os anos. Até então, o DCO tinha aplicações limitadas, sendo utilizado principalmente na fabricação de ração animal e biodiesel. Com a nova tecnologia, ele ganha potencial para substituir combustíveis fósseis na aviação, um setor que busca reduzir suas emissões de carbono.

O poder da enzima descoberta

Os cientistas estudaram uma classe de enzimas chamadas P450 decarboxilases, que atuam removendo grupos carboxila de ácidos graxos presentes no óleo residual da produção de etanol de milho. Esse processo permite a conversão desses compostos em moléculas semelhantes às do petróleo refinado, sem necessidade de processos químicos agressivos.

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As enzimas P450 decarboxilases transformam compostos do óleo residual do etanol de milho em hidrocarbonetos, abrindo caminho para biocombustíveis renováveis.

A grande inovação do estudo foi entender como essa enzima consegue converter óleos vegetais diretamente em hidrocarbonetos de forma eficiente. Utilizando técnicas de cristalografia de raios X e simulações computacionais avançadas, os pesquisadores identificaram mudanças estruturais que permitem que a enzima processe substratos insaturados, como o ácido oleico, um dos principais componentes do óleo de milho. Essa descoberta abre caminho para otimizar a produção em escala industrial e ampliar o uso de biocombustíveis na aviação e no transporte terrestre.

Do milho ao avião: sustentabilidade e potencial econômico

A aplicação dessa tecnologia pode trazer benefícios ambientais e econômicos. A produção de etanol de milho tem crescido no Brasil, principalmente no Centro-Oeste, onde o milho é cultivado em áreas já ocupadas, sem necessidade de desmatamento. O óleo de destilação, antes considerado um subproduto com pouca utilidade, agora pode ser um componente essencial para a produção de combustíveis renováveis.

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A produção de etanol de milho no Brasil cresce de forma sustentável, e seu subproduto pode se tornar uma fonte valiosa de biocombustíveis renováveis.

Além disso, essa nova abordagem contribui para reduzir a dependência dos combustíveis fósseis e mitigar as emissões de gases de efeito estufa. Segundo os pesquisadores, o processo desenvolvido pode produzir até 1,7 gramas de hidrocarbonetos por litro de DCO processado, com um alto rendimento em comparação a outros métodos. Se aplicado em larga escala, pode transformar toneladas de óleo residual em combustível limpo, reduzindo os impactos ambientais da aviação.

Um futuro movido a enzimas?

A pesquisa ainda está em fase de desenvolvimento, mas os resultados são promissores. Os cientistas agora trabalham na otimização da enzima e no aprimoramento do processo para torná-lo economicamente viável em escala industrial. Outras matérias-primas, como óleos de babaçu e macaúba, também estão sendo estudadas como potenciais fontes de biocombustíveis utilizando a mesma abordagem.

Se essa tecnologia avançar, poderemos estar diante de uma revolução na indústria de combustíveis sustentáveis. O que antes era um resíduo da produção de etanol pode, em breve, abastecer aeronaves, caminhões e até mesmo navios, tornando o transporte global mais verde e eficiente.

A ciência, mais uma vez, mostra que a inovação pode transformar desafios ambientais em oportunidades sustentáveis para o futuro.

Referência da notícia

Coordinated conformational changes in P450 decarboxylases enable hydrocarbons production from renewable feedstocks. 22 de janeiro, 2025. Generoso, W.C., Alvarenga, A.H.S., Simões, I.T. et al.